Sempre fui uma menina muito contida,
não falava mais do que o necessário. Minha criação foi feita pelos meus avós,
em sua grande casa que era repleta de antiguidades de várias gerações de nossa
família. Tenho lembranças boas de todos aqueles objetos, que para mim
representavam lembranças de meus antepassados, porem um em especial me chamava
muito a atenção. Um espelho, ele era redondo e sua aparência antiga demonstrava
o desgaste pelo tempo, mas o grande motivo que me fazia ficar horas olhando
fixamente para ele, era a forma anormal com que ele me refletia. Apesar de
imagem ser a minha algo causava estranheza, − não sei exatamente como descrever
−, era como se fosse uma outra pessoa, mas com minha aparência.
Quando completei meus 20 anos decidi
que já era hora de sair da casa dos meus avós, parti rumo ao centro da cidade,
e lá aluguei uma casa modesta, no dia de minha partida, minha avó veio até mim
e me disse: − Leve o espelho consigo minha filha, será uma forma de se lembrar
de nós mesmo estando longe – não havia como negar tal pedido, então continuei
minha parceria com “A Outra Rebeca”.
Já estalada em minha nova moradia,
porém não estava tendo muita sorte em arrumar um emprego, em mais uma noite sem
sucesso, cai aos prantos, sabia que minha timidez afastava as oportunidades,
mas era algo mais forte que eu. Então parei na frente do velho espelho,
precisava de um conselho, uma ajuda, qualquer coisa.
Foi ai que eu ouvi... Era fraco como
um sussurro, mas eu ouvi, vinha do reflexo “A Outra Rebeca”, estava tentando se
comunicar comigo. No início ela me consolava, e nos meses seguintes comecei uma
total mudança em minha personalidade, seguindo suas recomendações.
As coisas começaram a dar certo para
mim, consegui um trabalho, e com a ajuda dos conselhos do espelho eu comecei a
me envolver com Antônio, um homem esguio, de cabelo curto, apesar dos cabelos
grisalhos não tinha a idade que aparentava, nossas paqueras foram se intensificando,
até o momento em que finalmente o convidei a vir em minha casa. Preparei a casa
para a chegada dele, posicionei o espelho em um canto da sala para que “A Outra
Rebeca”, pudesse me ajudar com seus conselhos.
Sua chegada foi pouco depois do pôr do
sol. Antônio estava muito bem trajado – me senti até envergonhada perante
tamanha elegância – logo nos sentamos para conversar, porem os interesses de
Antônio pareciam outros, e pouco tempo uma de suas mão foi pousada em minha perna,
talvez pela minha natureza tímida fiquei extremamente incomodada com essa
atitude, sem saber bem o que fazer olhei para o espelho, quando fiz isso tive
como resposta: – Cuidado com esse homem, suas intenções não são boas – senti
todo meu corpo congelar perante tal afirmação, minha mente foi recheada com
dúvidas, ainda atônita me levantei e caminhei até o espelho. Fiquei frente a
frente com meu próprio reflexo, então baixei a cabeça para refletir qual seria
minha decisão, ouvir o que o espelho diz e dispensar Antônio de minha casa, ou ignorar
o aviso e continuar com o encontro.
Mas antes mesmo de terminar meu
raciocínio Antônio se levantou, e se aproximou perguntando o que estava
acontecendo, quando levantei novamente a cabeça para olhar o espelho, vi pelo
reflexo que Antônio estava com uma faca em uma de suas mãos, em um movimento
rápido peguei uma lata que usava de porta canetas e acertei sua cabeça, ele
caiu desacordado.
Em estado de choque eu tentava pensar
o que estava acontecendo, em busca de auxilio me voltei para o espelho
novamente. Mate-o dizia o espelho – Aproveite enquanto ele não pode reagir – não
tinha certeza se deveria ou não mata-lo, mas com tamanha insistência vinda da
“Outra Rebeca”, não tive outra escolha, fui até a cozinha e busquei a mais
afiada faca que encontrei, voltei até a sala e antes de executar o ato em si
olhei novamente para o espelho. Um sorriso largo se apresentava em meu reflexo,
e sem hesitar golpeei seu peito, muito sangue começou a jorrar, continuei cortando
seu corpo até o separar em várias partes. O espelho me aconselhou a enterrar os
restos de Antônio por vários lugares diferentes, e assim o fiz por toda a
madrugada. Quando o sol já estava nascendo retornei à minha casa, e mais uma
vez olhei para o espelho, porem dessa vez meu reflexo não parecia estar
diferente, e não ouvi mais nenhuma voz da “Outra Rebeca”, encarei meu próprio
reflexo por algum tempo até chegar ao pensamento.
Será que esse tempo todo
era apenas meu verdadeiro eu que estava sendo refletido?